Crítica: Confira o que achamos do Punho de Ferro na Netflix

7 min de leitura
Imagem de: Crítica: Confira o que achamos do Punho de Ferro na Netflix
Imagem: IGN

“Punho de Ferro”, o último dos heróis de rua da Marvel Comics a chegar ao serviço de streaming Netflix antes da reunião de todos os personagens em “Os Defensores”, estreou sua primeira temporada completa na sexta-feira (17). Depois de uma maratona com os 13 episódios dá para dizer — sem spoilers, fiquem tranquilos — que o resultado não foi o esperado mas teve alguns bons momentos e serviu para ampliar o universo da Casa das Ideias nas telinhas.

Herói foi criado nos anos 70, durante a febre dos filmes de kung fu

Daniel “Danny” Thomas Rand, mais conhecido como Punho de Ferro, foi um personagem criado pela lendária dupla Roy Thomas e Gil Kane (famosos pela passagem em Conan e pela gestação de outros heróis) nos anos 70, durante a febre dos filmes de kung fu. Ainda que não ele nunca tenha tido assim tanta complexidade ou popularidade nos quadrinhos, ficou famoso no Brasil por integrar o mix da revista Heróis da TV, nos anos 80, juntamente com o Mestre do Kung Fu.

Na tevê, sua trama “mapeia” mais um dos cantos da Nova York sombria da Marvel: Demolidor e Jessica Jones situam-se em Hell’s Kitchen e arredores, enquanto Luke Cage atua no Harlem e Danny Rand tem sua trama na região de Manhattan.

E tudo começa…

A Rand Entreprises é uma das maiores empresas do mundo, atua globalmente com fábricas e laboratórios químicos e foi criada e administrada por Wendell Rand (David Furr) e Harold Meachum (David Wenham). Depois de uma queda de avião em que Wendell, sua esposa Heather (Victoria Haynes) e o filho Danny (Finn Jones) são dados como mortos, Harold e os filhos — Joy (Jessica Stroup) e Ward (Tom Pelphrey) — assumem o controle da companhia.

Os irmãos Joy e Ward Meachum

Quinze anos depois, Danny aparece em Wall Street em busca de respostas e descobre que Harold também faleceu. Joy e Ward então questionam a autenticidade do herdeiro e aí começa a luta de Danny para reaver o que é seu por direito e saber mais sobre sua jornada como a arma viva conhecida como o imortal Punho de Ferro.

Lutas pouco inspiradas

Uma das coisas que a produção da Netflix tinha acertado até então foram os estilos de luta de cada série. Demolidor mistura as artes marciais e boxe, Jessica Jones tem o combate físico e psicológico e Luke Cage é um brawler, aquele que leva porrada mas não cai. Já o Punho de Ferro viria para ser o verdadeiro artista marcial com ênfase em kung fu. E isso não aparece exatamente como deveria.

Os fãs gostariam de ver combates no estilo visto em "Kill Bill", que bebe na mesma fonte dos criadores do personagem

Todas as coreografias até parecem belas, como uma dança, mas tudo deve ter sido feito inúmeras vezes em câmera lenta. Basta ver um filme antigo do Bruce Lee ou do Jackie Chan — que não tinham 1/10 da verba injetada por aqui — para notar a grande diferença.

Obviamente, Finn Jones não é um lutador lendário. Porém, dê uma olhada no que Quentin Tarantino fez com Uma Thurman em “Kill Bill” para sacar o que os fãs gostariam de ver nas telinhas: afinal de contas, o próprio Tarantino bebeu na fonte de onde Roy Thomas e Gil Kane se influenciaram. Até há certos momentos em que as sequências flertam com isso, mas tudo passa muito longe do ideal.

A perda de foco sobre os temas

Enquanto “Demolidor” se concentra primordialmente em gentrificação, “Jessica Jones” em abuso e “Luke Cage” em violência nas ruas e preconceito, fica difícil estabelecer exatamente qual é o principal foco do Punho de Ferro: seria um conflito familiar, a brigas no universo das altas finanças, o misticismo ou a crítica sobre tóxicos e elementos naturais?

Há um pouco de tudo isso citado acima, entretanto nenhum dos temas se resolvem satisfatoriamente. Em certos momentos, parece que os produtores querem colocar tudo em um mesmo episódio e o resultado fica confuso, sem que nenhum dos plots tenha uma solução ou questionamento relevante.

Em alguns momentos são tantos diálogos insossos e “preguiças” de roteiro que a imersão nesse universo chega a ser pouco provável, muito menos a empatia do público com os protagonistas. O que a trama inicial evoca seria algo como uma luta pelo poder de filmes como “Wall Street” e até há uma fagulha nesse sentido — não o suficiente para empolgar os fãs.

Ah, as atuações

E por falar nos protagonistas, poucos deles são consistentes em toda a trama. Enquanto Finn Jones até traz uma carga dramática quando está ao lado de Jessica Henwick (Colleen Wing), não convence muito como o forasteiro que virou um monge guerreiro. E muito menos lutando.

Rosario Dawson rouba a cena, mais uma vez como Claire Temple, e conecta com as outras séries Netflix/Marvel

Já Jessica Henwick surpreende como uma ótima coadjuvante, apesar dos altos e baixos do roteiro. A família Meachum chega a oferecer interessantes plots para a trama — seriam eles inimigos ou aliados? —, porém, mais uma vez, o que poderia ser melhor explorado é ofuscado pela falta de foco dos produtores.

A Enfermeira Noturna, Claire Temple

Para completar, Rosario Dawson repete o papel da Enfermeira Noturna Claire Temple e oferece alívio cômico, um lado mais “pé no chão” e conexão com as outras séries, especialmente “Demolidor” e “Luke Cage”. Vale mencionar também Carrie-Anne Moss, que faz mais uma vez — e bem — o papel da advogada inescrupulosa Jeri Hogarth.

Não é uma história de origem… Mas é

Assim como todas as outras séries das Netflix, esta não é uma história de origem do personagem e sim do herói: a trama conta como Danny Rand deixa de ser apenas filho de empresário e monge místico para se tornar o Punho de Ferro da Marvel.

Não espere ver Danny Rand conseguindo seus poderes ou seu treinamento para se tornar um artista marcial

Então, não espere ver como exatamente ele ganha seu soco poderoso ou seu treinamento até se tornar um expert em kung fu. Aliás, isso talvez seja uma das razões pelas quais muita gente tenha se frustrado: aqui você não verá Danny subindo escadas com baldes d’água no cangote no “estilo Pai Mei de aprendizado” e sim o rapaz já pronto para a pancadaria.

A ausência de mais passagens pela cidade mágica K’un-Lun também faz com que a experiência pela qual o protagonista descreve ter passado ser um tanto quanto inverossímil no contexto.

Tem parte boa também, calma

A série tem lá seu bons momentos. Apesar de parecer uma criança mimada irritadinha a maior parte do tempo, a construção do Punho de Ferro foi boa. Ele é falível e humano. Mesmo poderoso, é também bastante impulsivo, egocêntrico e manipulável. Isso será especialmente importante quando ele se juntar ao Luke Cage, parceiro de longa data nos quadrinhos: Cage deverá ser um complemento para Danny Rand e essa dinâmica pode render ótimos momentos, ainda mais com os outros Defensores.

O Tentáculo, mencionado em Demolidor várias vezes, foi finalmente mostrado por aqui

Colleen Wing, que já fez parceria com a Misty Knight nos quadrinhos, segue essa mesma tendência, de ser parceira da personagem na próxima trama. O Tentáculo, que era algo meio nebuloso para a audiência da Netflix, aqui é melhor explicado e se conecta bem com os eventos das outras tramas.

Colleen Wing foi um dos triunfos da série

O herói não foi criado para ser algo muito complexo nos anos 70, portanto, o esforço dos roteiristas para ampliar um contexto dramático que possa ser explorado futuramente vale a menção: rendeu momentos interessantes ao longo da história, especialmente com relação à dinâmica familiar com os Meachum.

O temas místicos foram tratados de uma forma curiosa. Como todo mundo sabe, em nenhum momento as outras aventuras trataram esse cantinho da Casa das Ideias na tevê e suas histórias com algo relacionado a poderes ou elementos sobrenaturais. Então, o devastador Punho de Ferro e a ressurreição de pessoas ligadas ao Tentáculo — coisa recorrente nas revistas, inclusive com a Elektra — são mostradso de uma maneira crua e bem aceitável.

Tá, mas vale a pena?

Se você não curte muito super-heróis e desprezou as outras séries da parceria entre a Marvel e a Netflix, talvez nem mesmo consiga passar dos primeiros episódios. Após o sétimo capítulo — e sempre há um plot twist nessa altura das outras tramas também — tudo fica ainda mais devagar e insosso, até a reta final, que retoma os bons elementos.

Os Defensores reunidos — note o "616" no caminhão, um easter egg sobre o universo "tradicional" da Marvel Comics, a Terra-616

Agora, se você é fã de carteirinha do Punho de Ferro dos quadrinhos e assistiu tudo o que foi lançado sobre esse universo, precisa ver o que acontece porque todos os subplots apresentados desde a primeira temporada de “Demolidor” fecham um círculo aqui, justamente para serem explorados em “Os Defensores” — que já encerrou as gravações e tem estreia agendada para os últimos meses do ano.

Você sabia que o TecMundo está no Facebook, Instagram, Telegram, TikTok, Twitter e no Whatsapp? Siga-nos por lá.